Se as cifras pagas por empresários de ônibus do Rio de Janeiro em propina para autoridades do estado, eram milionárias, como revelou nos primeiros dias do mês a Operação Ponto Final, braço da Lava-Jato, faltou investimento no serviço para o qual suas empresas foram contratadas, em consórcios, após licitações municipais. Na Zona Oeste, passageiros reclamam que pelo menos nove linhas desapareceram das ruas, após a falência de viações que atendiam a região. Outras quatro voltaram a rodar, mas só no começo da manhã e no fim da tarde, de segunda a sexta-feira.
Não era para ser assim. O contrato de concessão com a prefeitura inclui, entre as obrigações dos consórcios, garantir regularidade e continuidade do serviço. Assim, caso uma empresa não consiga atender a demanda, outra do consórcio deve substituí-la. As linhas que deixaram os usuários a pé pertenciam às viações Algarve, Rio Rotas, Bangu e Andorinhas, que faliram desde 2015.
Por dois dias, o EXTRA percorreu pontos finais, ouvindo passageiros e rodoviários, e constatou o problema, observável também no serviço de dados abertos da prefeitura, disponibilizados na internet, que se baseia em informações do GPS dos coletivos.
Na Praça do Piriquito, em Realengo, por exemplo, a placa da parada do 367 ainda está lá. Mas, nenhum ônibus passa ou para ali há mais de ano. O lugar agora virou ponto de vans.
— Era nossa única opção para o Centro. Fazia diferença para o trabalhador — lamenta o barbeiro Edilson Werneck.
Prejuízo para quem trabalha longe de casa
O supervisor de farmácia Israel de Jesus Lima, de 25 anos, morador de Bangu, precisou da compreensão do chefe para recusar a transferência para a filial da Ilha do Governador e continuar em Ramos. A razão foi o sumiço da linha 933, única que poderia levá-lo ao novo local de trabalho sem precisar de baldeação. Sem ela, teria de pegar três conduções até a Ilha. Ele se surpreendeu quando soube que a linha, assim como outras cinco inexistentes na prática, consta no site do Rio Ônibus como ativa.
— Só se mudaram o itinerário e não avisaram a ninguém, porque aqui em Bangu ela não é mais vista — diz.
A recepcionista Rosana Andrade, de 29 anos, mora em Senador Camará, na Zona Oeste, e depende da 395 para ir ao trabalho em Botafogo, na Zona Sul. Para conseguir pegar o ônibus, que roda em horário limitado, precisa estar no ponto às 5h, quando sai o último dos três que partem para o Centro no começo do dia. Depois, a linha só volta a circular das 17h às 19h. A informação é confirmada por rodoviários.
— Como trabalho das 7h às 19h nunca consigo voltar no 395, pois o último sai do ponto, no Centro, no mesmo horário em que estou deixando o serviço. Então, sou obrigada a pegar três conduções para voltar para casa — reclama.
O comerciário Rafael Monteiro, de 24 anos, morador de Santa Cruz, diz que além de funcionar em horário limitado, o 388 some das ruas nos feriados e fins de semana.
Pressão de moradores
Um abaixo-assinado com mais de mil nomes pede a volta da 750 (Sepetiba-Coelho Neto). O documento foi protocolado na Secretaria Municipal de Transportes (nº 297/2016) em setembro, pelo morador Diego Alves, de 26 anos. Já o técnico de informática Jorge Lucas Araújo, de 21, morador de Cosmos, disse que a pressão na sua vizinhança é pela regularização do 358, hoje restrito aos horários de rush.
A Secretaria Municipal de Transportes (SMTR) informou que, das linhas citadas, três (684, 750 e 754) foram extintas em função de reorganização do sistema de transporte. Quanto às demais , a SMTR constatou a deficiência no serviço e notificará o consórcio para que retorne às atividades, sob pena de multa.
Leia na íntegra a nota do Rio Ônibus:
"O fechamento, nos últimos dois anos, de cinco empresas que atuavam na Zona Oeste (Algarve, Andorinha, Rio Rotas, Top Rio e Bangu) levou o consórcio Santa Cruz a operar algumas linhas em caráter de contingência. A crise econômica, o não reajuste anual da tarifa (que deveria ter ocorrido em janeiro) e a concorrência desleal de kombis e vans ilegais aprofundam as dificuldades financeiras das empresas.
As linhas 684, 750 e 754 foram extintas pela Prefeitura há cerca de um ano. As demais citadas pela reportagem estão com itinerários cobertos por linhas que operam trajetos semelhantes com a facilidade do Bilhete Único, que permite o passageiro pegar dois ônibus pagando apenas uma única tarifa".
Leia na íntegra a nota da Secretaria municipal de Transportes:
"A Secretaria Municipal de Transportes ressalta que o contrato firmado é com os consórcios, e não com as empresas individualmente. Cada consórcio tem obrigação contratual de manter o serviço operando de forma regular e adequada para a população.
A SMTR informa que entre as linhas relacionadas como inoperantes, as linhas 684, 750 e 754 foram extintas em diferentes datas, sendo a linha 684 extinta em 31 de julho de 2015 e as outras duas extintas em 21 de junho de 2016. Estas extinções ocorreram em função de reorganização do sistema de transporte desde que o BUC (Bilhete Único Carioca) foi implementado no ano de 2010, permitindo uma integração no sistema de transporte por ônibus sem o pagamento da segunda tarifa dentro de prazo determinado.
Quanto às demais linhas citadas, a SMTR constatou a deficiência no serviço e notificará o Consórcio responsável para que retorne a operacionalização das mesmas e apresente as razões da inatividade, podendo acarretar em multa ao Consórcio.
A média de passageiros transportados por dia (e por linha) era de 349 (trezentos e quarenta e nove)".
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